No site da presidência da Republica informa que o Presidente da República decidiu devolver à Assembleia da República, sem promulgação, o diploma desta que procedia à reposição de freguesias agregadas pela Lei n.º 1-A/2013, de 28 de janeiro.
Na mensagem enviada ao Parlamento, o Presidente da República refere três dúvidas sobre o diploma, solicitando que o reaprecie.
“A primeira dúvida é relativa à reversão parcial da reforma de 2013, iniciada em 2011, e ao facto de ser contraditória com a linha dominante, inspirada pelas instituições europeias, de um envolvimento das autoridades locais num novo modelo multinível de governança; a segunda dúvida tem ver com a falta de compreensão ou transparência pública do processo legislativo, os seus avanços e recuos, as suas contradições, as hesitações e sucessivas posições partidárias, a inclusão e a exclusão de freguesias, e, sobretudo, o respeito rigoroso dos requisitos técnico-legais a preencher, para ser possível a desagregação; a terceira, e decisiva, é sobre a capacidade para aplicar as consequências do novo mapa já às eleições autárquicas de setembro ou outubro deste ano, daqui a pouco mais de seis meses.
Assim, o Presidente da República solicita à Assembleia da República que pondere, uma vez mais, a praticabilidade da aplicação do mencionado diploma no horizonte deste ano eleitoral de 2025.
“Mensagem enviada ao Presidente da Assembleia da República:
“Palácio de Belém, 12 de fevereiro de 2025
A Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República,
Assunto: Decreto da Assembleia da República n.º 37/XVI, de 17 de janeiro de 2025, sobre “Reposição de freguesias agregadas pela Lei n.º 1-A/2013, de 28 de janeiro, concluindo o procedimento especial, simplificado e transitório de criação de freguesias previsto na Lei n.º 39/2021, de 24 de junho”
1. São três as principais dúvidas que se podem suscitar – e têm sido suscitadas – acerca do novo mapa de freguesias, constante do Decreto submetido a promulgação.
2. A primeira é a de implicar uma reversão – para alguns um grave retrocesso –, num caminho de reordenamento e de racionalização do Poder Local, assim questionando a essência da reforma de 2013.
Quanto a esta dúvida, um juízo sereno demonstra que, de facto, há uma reversão parcial da reforma e que ela é contraditória com a linha dominante, inspirada pelas instituições europeias, de um envolvimento das autoridades locais num novo modelo multinível de governança, como evidenciado no relatório de abril 2024 de Enrico Letta.
E não se afigura desejável haver orientações flutuantes, num caminho definido, mesmo que ele motivasse reparos ou críticas pelo seu radicalismo, ou processo, como, na altura, exprimi, como cidadão.
No entanto, o certo é que, em Democracia, por definição, as mudanças de Governo, de maioria parlamentar ou, tão somente, de orientação, são possíveis e traduzem um pulsar normal do pluralismo democrático.
Aliás, a revisão cobre apenas menos de um terço das agregações de 2013 e não toca nas entidades supramunicipais, versadas naquela ocasião.
Isto mais se acentua com o facto de a maioria parlamentar votante agora ser muito mais representativa do que a de 2013, só se opondo um partido – a Iniciativa Liberal.
Mais ainda – os partidos defensores de caminho oposto, em 2011 e em 2013, subscreveram e votaram a nova solução.
Finalmente, nos termos da lei, ela traduziu prévia expressão de vontade das populações.
Logo, esta dúvida não apresenta a seu favor argumentos que pesem decisivamente contra a promulgação do Decreto.
3. Segunda dúvida suscitável e suscitada respeita ao processo que culminou no Decreto. A sua falta de compreensão ou transparência pública, os seus avanços e recuos, as suas contradições, as hesitações e sucessivas posições partidárias, a inclusão e a exclusão de freguesias, e, sobretudo, o respeito rigoroso dos requisitos técnico-legais a preencher, para ser possível a desagregação.
Quanto à evolução das posições partidárias, não é possível transformar o juízo subjacente à promulgação em escrutínio daquilo que vai sendo a conversão de discordâncias em voto favorável ou abstenção finais. Tudo do foro partidário.
Quanto à análise, freguesia a freguesia, do rigor do cumprimento dos requisitos técnico-legais, é impossível no prazo da promulgação ou veto, aceder o Presidente da República a esse manancial de dados, que ocuparam os parlamentares ao longo de meses, senão de anos, designadamente através de grupo de trabalho cujos trabalhos foram mantidos de forma reservada.
Não seria politicamente e, em especial, legalmente honesto, formular um juízo perentório, positivo ou negativo, sem conhecimento de dados necessariamente numerosos e complexos. Tudo em vinte dias.
4. Resta a última dúvida e essa não menos importante. A da capacidade para aplicar as consequências do novo mapa já às eleições de setembro ou outubro deste ano.
Formalmente, é tudo fácil. A eleição de novos autarcas equivale ao começo da instalação de novas autarquias e, depois, a comissão instaladora curará do resto.
É verdade que o prazo que dista da eleição é superior a seis meses.
Mas, a complexidade da instalação, e resolução dos problemas emergentes é variável de freguesias para freguesias desagregadas e pode ser mesmo, aqui e ali, muito complexo.
Por isso, e não por qualquer fetichismo de datas, em matérias como esta – e isso já aconteceu com matéria mais simples, em 2021 –, considerei desejável evitar alterações legislativas em ano eleitoral.
Se fosse, como aconteceu nas eleições europeias de 2024, apenas facilitar a mobilidade no voto, ou, como se pretendia nas eleições regionais madeirenses, facilitar mobilidade, paridade e voto em Braille, seria mais simples mudar a lei, desde que antes da convocação da eleição.
Na reinstalação, que o mesmo é dizer, recriação de autarquia local, a minha preocupação com a concretização é maior.
Razão esta, e única, para devolver o presente Decreto à Assembleia da República.
Não por questionar a vontade das populações, a legitimidade parlamentar para reversões, a começar nos partidos antes adeptos do revertido, nem por ter matéria de facto disponível para contradizer a aplicação dos requisitos técnico-legais das desagregações.
Apenas por imperativo de consciência quanto à capacidade para executar a nova lei, sem subsequentes questões de Direito – ou de facto – patrimoniais, financeiras, administrativas ou outras, resultantes do tempo disponível.
5. Compete à Assembleia da República, se tal o entender, reafirmar a sua vontade. Assim confirmando aos portugueses que se não tratou de solução ditada por razões ou conveniências conjunturais, antes exprime o resultado de uma longa e serena ponderação, que ditou a inclusão de umas e a exclusão de outras freguesias, numa linha de não só reverter uma política de fundo de 2013, como substituí-la por outra melhor para Portugal.
Nestes termos, devolvo, sem promulgação, nos termos do artigo 136.º, n.º 1, da Constituição, o Decreto da Assembleia da República n.º 37/XVI, de 17 de janeiro de 2025, sobre “Reposição de freguesias agregadas pela Lei n.º 1-A/2013, de 28 de janeiro, concluindo o procedimento especial, simplificado e transitório de criação de freguesias previsto na Lei n.º 39/2021, de 24 de junho”, para que, querendo, a Assembleia da República pondere, uma vez mais, a praticabilidade da aplicação do mencionado diploma no horizonte deste ano eleitoral de 2025.