O Comité Olímpico de Portugal (COP) e o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC) assinam protocolo de colaboração centrado na formação como meio privilegiado para a prevenção da corrupção.
Decorreu no dia 18 de dezembro a assinatura de protocolo de colaboração centrado na formação como meio privilegiado para a prevenção da corrupção tendo na ocasião Olívio Mota Amador, vice-presidente do MENAC, um dos subscritores do documento, considerado o desporto como “um setor essencial para prevenir os riscos de corrupção”, de modo a ajudar no cumprimento da missão definida para a organização: “A promoção da transparência da integridade na ação pública e a garantia da efetividade de políticas de prevenção da corrupção e de infrações conexas.”, acrescentando ainda que este passo em conjunto se justifica pelo “prestígio do COP” e permitirá “a realização e a abertura de um conjunto de iniciativas de formação, não só no âmbito da concretização da efetividade do Regime Geral de Prevenção da Corrupção, como também do Regime Geral de Proteção dos Denunciantes de Infrações.”
O presidente COP, Artur Lopes, sublinhou que “o desporto é e deve ser, para o homem, fruto de uma educação, de fair-play, de integridade, de defesa da honestidade, da lealdade pelos seus adversários. Não há medalha que não tenha verso e o reverso traz, muitas vezes, a corrupção, traz o doping, tantas coisas que urge não meter a cabeça na areia e lutar contra.”, disse ainda Portugal ser um país “não só cada vez mais limpo, mais puro, mais transparente, mais humano, mas também mais voltado para o futuro, um futuro livre, limpo.”
No âmbito desta assinatura, realizou-se a mesa-redonda “Corrupção no Desporto”, na qual participaram Pedro Fonseca, diretor da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária e coordenador da Plataforma Nacional de Combate à Manipulação das Competições Desportivas; Nuno Borges, atleta olímpico; Duarte Gomes, ex-árbitro de Futebol e comentador de arbitragem; Marco Santos, da Federação de Andebol de Portugal/Treinadores de Portugal; e João Paulo Almeida, diretor-geral do COP. A moderação foi assegurada por Diogo Nabais, diretor do Departamento Jurídico e de Qualificação do COP.
João Paulo Almeida, diretor-geral do COP, elogiou a existência da Plataforma Nacional de Combate à Manipulação das Competições Desportivas e apontou uma necessidade básica para enfrentar o problema da corrupção. “Para saber atacar este fenómeno há aqui uma dimensão que é muito importante, a dimensão cultural”, alertou. “Por isso é que no COP, de acordo com as nossas competências, consideramos crucial trabalhar no pilar da prevenção, da sensibilização, da educação.” João Paulo Almeida reforçou ser “muito importante conseguir passar a mensagem. Ou se muda o quadro cultural de quem tem competências de governação de uma organização desportiva, desde um clube até ao Comité Olímpico de Portugal, ou então, quando se entra com os mecanismos sancionatórios já é muito complicado.”
Pedro Fonseca, diretor da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária e coordenador da Plataforma Nacional de Combate à Manipulação das Competições Desportivas, considerou a “Plataforma Nacional” como um “mecanismo fundamental e holístico” para combater a corrupção. “Basta olhar para os nove peritos e para as valências que eles podem trazer e que acrescentam a um sistema já muito trabalhado. Antes da aquisição de notícias de crime, nós temos de pensar na Plataforma como um centro difusor por exemplo de educação, de preparação de federações, de criação de instrumentos para ver, por exemplo, aquilo que eu conheço bem na Federação Portuguesa de Futebol, na área de integridade, que divulga conhecimento, divulga punições. É uma forma de criarmos mecanismos de prevenção geral.” Pedro Fonseca sublinhou ainda que antes havia “instrumentos legais perfeitamente obsoletos, molduras penais ridículas que limitavam a utilização de instrumentos de investigação que nem sequer podiam ser propostos ao Ministério Público e a um juiz de instrução, porque não tinham viabilidade legal para serem utilizados.” E houve trabalho a realizar junto da Assembleia da República, apresentando propostas no sentido da proteção da integridade. Neste momento, considera Pedro Fonseca, “somos um país pioneiro nos instrumentos que temos à disposição para poder fazer investigações de excelência.”
O diretor da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária e coordenador da Plataforma Nacional de Combate à Manipulação das Competições Desportivas, estimulou ainda à denúncia de situações que possam configurar casos de corrupção. “Eu não preciso da figura de um denunciante concreto, eu preciso de informação criminal, preciso de informação que pode ainda não ter sequer a dignidade de ser a informação de um crime específico, de uma notícia de crime concreto, mas é uma parcela de informação que pode ser trabalhada.”
Nuno Borges, tenista profissional, atleta olímpico, confessou ter-se apercebido das ameaças de corrompimento da integridade existentes no Ténis “já tarde”, tendo abordado primeiro os problemas de dopagem com que a modalidade se debate e têm jogadores de topo como Iga Swiatek e Jannik Sinner protagonistas. “Os atletas estão a levar os seus limites cada vez mais longe e procuram soluções.” O maior problema não está, apesar destes dois casos, centrado no doping, mas no ‘match fixing’, “na pressão que existe dos apostadores” a falarem com jogadores de 16, 17 anos, “nos primeiros torneios internacionais em que não há tantas câmaras, não há tanto público. Acaba por ser só mais um jogo. Há centenas de jogos desses a acontecer por semana em que se calhar o controlo não é tão grande.” O tenista da Equipa Portugal revelou que as pressões sofridas através das redes sociais são em elevado número. “Tentamos ao máximo não prestar atenção às mensagens e mesmo ignorando-as eles arranjam uma maneira de as fazer chegar. Vêm ter connosco ao nosso hotel, ao clube, e fazem ameaças. As entidades não conseguem dar vazão às denúncias. São centenas, para mim já são dezenas e, se calhar, para outros jogadores podem ser milhares de comentários. É impossível controlar cada um desses indivíduos.”
Duarte Gomes, ex-árbitro de Futebol e comentador de arbitragem, explicou que durante os seus 25 anos de carreira viu “muita coisa acontecer. Havia aliciamento de vários agentes desportivos, nomeadamente árbitros, de forma muito fácil, muito básica, praticamente com transações à vista de toda a gente, que eram de conhecimento público, aliás várias comprovadas depois em tribunal, com trânsito em julgado.” Mas os tempos mudaram, com muito trabalho de prevenção produzido. “Além disso, há também um maior escrutínio. Hoje acho que o fenómeno está muito balizado, o que me continua a preocupar é algo que de algum modo foge aqui à questão legal, à questão da punição e do crime em si, que é a continuada simpatia excessiva para adulterar o subconsciente para a decisão. Ainda se vê em muitos campos de futebol uma excessiva simpatia, uma forma mascarada, falseada, de bem receber, obviamente não para corromper, não para subornar, não para a influenciar negativamente a pessoa, mas à espera que também a bondade possa alguma forma adulterar no processo de decisão.”
Marco Santos, da Federação de Andebol de Portugal (FAP) e da Confederação de Treinadores de Portugal, reafirmou a necessidade de as federações desportivas fazerem formação nesta área. “Costumo dizer que um agente desportivo bem informado é um agente potencial na prevenção” da corrupção. A existência de relatos quanto a situações de “match fixing”, levou a FAP “a tomar uma atitude. Sentimos que a formação seria o caminho a fazer”, estabelecendo uma parceria com o COP. “Começámos a aproveitar os estágios presenciais para proporcionar formação, não só nesta área do ‘match fixing, mas também na ética e noutras áreas, porque sabemos que estes atletas da seleção são líderes nas suas equipas. Então, sentimos que ao formarmos estes atletas potencialmente iríamos começar também a formar os atletas dos clubes.” A formação de treinadores é igualmente uma área de intervenção da FAP em colaboração com o COP.