Investigação realizada no Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-Iscte) explorou os fatores que protegem o bem-estar psicológico de adolescentes em acolhimento residencial. Os dados obtidos podem contribuir para melhorar as estratégias de intervenção neste contexto, informando a prática e as políticas referentes ao acolhimento residencial.
O objetivo desta investigação foi “identificar as perspetivas de adolescentes em acolhimento residencial sobre o conceito de resiliência, bem como sobre fatores que contribuem para o seu bem-estar psicológico”, explica a investigadora Micaela Pinheiro, doutoranda em Psicologia no Iscte-Instituto Universitário de Lisboa. De acordo com a investigadora, jovens em acolhimento residencial enfrentam, muitas vezes, adversidades que podem afetar a sua saúde mental e emocional, como o estigma social, relações familiares disruptivas ou de negligência e, ainda, situações de trauma e abuso. Apesar disso, alguns e algumas jovens apresentam resultados adaptativos de saúde mental. Portanto, importava perceber, acrescenta a investigadora, “que fatores contribuem para o bem-estar psicológico destes/as adolescentes?”
Para responder a esta questão, a equipa de investigação, que inclui as investigadoras do CIS-Iscte Eunice Magalhães e Joana Baptista, entrevistou 19 jovens de três casas de acolhimento portuguesas. De acordo com os dados obtidos, a maioria dos/as jovens desconhecia o conceito de resiliência e os/as que o conheciam, tiveram dificuldades em defini-lo. Através da análise do conteúdo das entrevistas, foi ainda possível identificar diversos fatores que estes e estas adolescentes consideraram importantes para a sua resiliência.
“O suporte social, dos pares e do staff da casa de acolhimento, foi um dos fatores mais mencionado pelos jovens entrevistados”, afirma Eunice Magalhães. “A maioria dos adolescentes salientou, aliás, a importância do apoio emocional”, acrescenta. Ainda no contexto da casa de acolhimento, o apoio financeiro como promotor de autonomia, a abertura para o envolvimento da família e a estabilidade foram também identificados como importantes. Para além disso, foram identificados fatores externos à casa de acolhimento, como a participação em atividades extracurriculares, que parecem fomentar sensações de empoderamento e segurança e, mais uma vez, o suporte social, nomeadamente, da família; mas também fatores individuais relacionados com os próprios jovens, como as estratégias de coping (os processos cognitivos utilizados pelas pessoas para lidar com situações de stress e gerir problemas no dia-a-dia), as competências de regulação emocional e o otimismo. Contudo, a equipa de investigação alerta para as limitações do estudo, realizado a partir de uma amostra de conveniência numa única cidade e que, por isso, não permite uma generalização para a diversidade de contextos a nível nacional.
A investigadora Joana Baptista fala sobre o potencial impacto desta investigação: “Estes dados salientam a importância do envolvimento da família e dos cuidados individualizados, o que pode orientar as intervenções nestes contextos e contribuir, em última análise, para um maior bem-estar psicológico nestes jovens”. No artigo, a equipa de investigação deixa quatro prioridades de intervenção bem claras para a promoção da resiliência destes/as adolescentes:
Garantir contacto familiar de qualidade para apoiar a resiliência dos/as adolescentes e facilitar processos de reunificação bem-sucedidos;
Melhorar a qualidade da relação entre jovem e o staff em acolhimento residencial, assegurando formação adequada para a prestação de suporte emocional, instrumental e financeiro;
Envolver a comunidade escolar e os seus recursos (e.g., professores)
As características individuais dos adolescentes como a auto-regulação e as estratégias de copingdevem ser consideradas no âmbito das intervenções em acolhimento residencial.
“Esperamos, com estas recomendações, poder informar não só a prática direta nos contextos de acolhimento residencial, mas também as políticas do próprio sistema de acolhimento”, conclui a investigadora Micaela Pinheiro. Este estudo foi realizado no âmbito do seu projeto de doutoramento, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (Ref. 2021.06556.BD).