Sexta-feira 23 de Novembro de 5883

Rock In Rio Lisboa 2010 – Dia 5: Resistentes do decibel

Rammstein2Trajados de preto e com muita flexibilidade giratória no pescoço. Assim se desejavam os participantes no derradeiro dia do Rock in Rio Lisboa, em linha com o cartaz de peso pensado para o fecho da iniciativa e com o espírito headbanger que ameaçava prevalecer.

{jathumbnail off}De facto, reunir os Soulfly, os Motörhead, os Megadeth e os Rammstein no Palco Mundo poderia ser encarado como demasiado ambicioso ou arriscado, mesmo para os mais rijos de ouvido. Até porque a tarde começou forte, com os Soulfly a canhonearem a audiência com um som poderoso e visceral (esta foi a banda que mais cativou os espectadores para o famigerado moche). O vocalista/guitarrista Max Cavalera não esqueceu o espólio dos Sepultura e trouxe velhos clássicos como Refuse/Resist ou Roots.

Os dois momentos mais interessantes do espectáculos dos Soulfly terão surgido quando o franzino Igor (filho de Max Cavalera) se juntou à banda para tocar na bateria o tema Troops of Doom – sem revelar qualquer fraqueza muscular – e quando o líder da banda envergou a camisola nº 12 da selecção portuguesa. Max Cavalera é um conhecido adepto de futebol e estima, portanto, a criatividade de CR9 e companhia.

Se os Soulfly apresentaram como argumentos vigor e determinação, os Motörhead trouxeram ate Lisboa a experiência de muitos anos na estrada. “Somos os Motörhead e tocamos Rock & Roll!”. Foi desta forma que o colectivo se apresentou, na voz do mítico Lemmy, antes de arrancar para um furioso Iron Fist. Infelizmente, o clímax foi cortado por uma falha de som, que demorou bons minutos a resolver (fenómeno invulgar numa organização como a que suporta o Rock in Rio). A banda conseguiu reanimar o público bem mais tarde, graças a uma soberba rendição de Over the Top. Seguiram-se outros momentos para mais tarde recordar, com realce para os temas Brazil, Killed by Death e sobretudo Ace of Spades (continua o incontestável hino internacional dos Motörhead).

As hostes metaleiras ganhavam então energia Megadeth-RockinRiocom o cair da noite e com a entrada em palco dos Megadeth. Durante muitos anos na sombra dos Metallica, a banda de speed/trash metal formada por Dave Mustaine revelou-se quase perfeita, na execução do seu reportório. Provavelmente, um dos sons mais bem conseguidos de toda a edição do Rock in Rio 2010, prejudicado apenas por algum acanhamento vocal do próprio Mustaine (conhece-se o seu apreço pelos sussurros e o timbre agudo, colocados aqui em prática, mas de modo hesitante). Fantástica a recriação de Skin o’ My Teeth, Holy Wars, Rust in Peace …Polaris, Headcrusher ou A Tout Le Monde (esta última cantada por um gigantesco coro de metaleiros, inusitados amantes de uma tão delicada linha melódica). A sintonia com o público foi notória, apesar de apenas 20% dos espectadores, segundo inquérito da organização, se terem deslocado expressamente ao Parque da Bela Vista para ver a banda norte-americana (16% confessaram-se atraídos pelos Soulfly, 25% pelos Motörhead e 39% pelos Rammstein). Os Megadeth prosseguiram até ao fim da sua actuação com precisão cirúrgica (Mustaine avisou que não havia tempo disponível para deambulações) e brindaram ainda os presentes com canções simbólicas do seu arsenal, em particular Symphony of Destruction (possui, ainda hoje, um dos mais expressivos riffs de todos os tempos) ou Peace Sells.

Rammstein1Os alemães Rammstein não poderiam exigir intróito mais eloquente e mostraram, logo no arranque, que tencionavam elevar a fasquia. Para quem está familiarizado com imagens dos concertos deste agrupamento germânico, as movimentações cénicas, as apocalípticas decorações de palco, o guarda-roupa e a pirotecnia podem emergir como o tempero base. Mas só quem ouviu os Rammstein ao vivo pode ajuizar da potência, nua e crua, da sua matéria-prima, capaz de tomar conta de todo o universo conhecido e desconhecido, assim que irrompe das colunas. Se os níveis sonoros se tinham apresentado escandalosamente altos, ao longo da jornada, com a banda alemã ultrapassaram qualquer expectativa concebível. Numa parábola mal desenhada, poder-se-ia dizer que a sonoridade dos Rammstein é herdeira dos medonhos bombardeiros Stukas… começa bem ao longe, com ténues silvos que o cérebro mal chega a compreender, antes da deflagração que aterroriza os menos preparados. As primeiras labaredas surgiram com o tema Waidmanns Heil, saga continuada por outros temas potentes no carácter industrial (as reminiscências de Ministry são indisfarçáveis) e na teatralidade. Pequena pausa – deliciosa na propagação de notas – surgiu com Frühling in Paris, para logo de seguida se iniciar nova cavalgada, em direcção a algumas das mais célebres criações dos meninos mal comportados que respondem às incitações de Till Lindemann. Mesmo para aqueles que têm dificuldade em perceber a mecânica deste aríete germânico, foi impossível não admitir o brilhantismo da sequência Benzin, Links 2 3 4, Du Hast e Pussy. Incendiária, no mínimo. A noite – e a edição 2010 do Rock in Rio – terminaram com um monumental fogo-de-artifício. Apesar de toda a pólvora empregue na empreitada, ressoaram ainda os acordes de Ich Will, a atestar que a música tudo vence…mesmo o silêncio e o negro que vêm de dentro.

 

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