A semana passada assistiu a forte atividade solar. De facto, ocorreram diversas erupções solares de classe X, com origem na região ativa do Sol chamada AR3664, um aglomerado de manchas solares com 16 vezes o diâmetro da Terra .
Dessa região ocorreram cinco ejeções de matéria coronal (sigla CME em inglês) entre os dias 8 e 9 de maio, que se dirigiram para a Terra.
A chegada das primeiras CMEs às vizinhanças da Terra teve lugar cerca das 18 horas de sexta-feira 10 de maio, fazendo-se sentir no aumento súbito de intensidade do campo magnético observado por exemplo no observatório magnético de Coimbra (COI) (figura 2). Este aumento de intensidade é causado pela compressão da magnetosfera terrestre, do lado voltado para o Sol, como resultado da colisão das CMEs. Desta interação resultou uma forte perturbação do campo magnético terrestre (tempestade geomagnética), classificada pela agência americana NOAA com o índice G5, numa escala de 1 a 5! A última tempestade geomagnética G5 ocorreu em outubro de 2003, há 20 anos atrás, e causou cortes de energia na Suécia e danificou transformadores na África do Sul.
Este é o género de evento que pode causar distúrbios vários nos serviços fornecidos por satélites tais como comunicações e posicionamento global, em serviços de comunicação por via de ondas rádio de alta frequência, para além de perturbações nas infraestruturas de transporte de energia elétrica e em sistemas de cantonamento automático de comboios que controlam a ocupação das linhas. Estes efeitos ocorrem em simultâneo com as coloridas auroras boreais (Norte) e austrais (Sul). Por norma são mais intensos a latitudes mais próximas das dos pólos. Países como a Suécia e Canadá (no hemisfério Norte) ou a Nova Zelândia e Austrália (no hemisfério Sul), têm um longo historial de registos deste tipo de incidentes e de ocorrência de espetaculares auroras.
Mas a noite de sexta para sábado 11 de maio foi especial, porque ofereceu-nos também a nós, em Portugal, auroras em vários pontos do país!
O máximo de intensidade da tempestade de 10 de maio até agora correspondeu a um índice Disturbance Storm Time (Dst) de -412 nanoteslas. Este índice dá informação relativa à intensidade de corrente num ‘anel’ que circunda o nosso planeta a uma altitude entre cerca 20,000 e 60,000 km, num plano inclinado de cerca 10º relativamente ao plano equatorial. Essa corrente elétrica circula num sentido tal que diminui a intensidade do campo magnético à superfície da Terra, como se pode ver na figura 2. A colisão dos eletrões e protões dessa corrente com as moléculas da atmosfera leva à perda de energia e ao decaimento ao fim de algum tempo. É previsível que o nosso campo magnético demore ainda alguns dias a regressar à normalidade.
A tempestade a que estamos assistir é excecional, mais intensa do que a de outubro de 2003 (Dst =- 383 nT), que provocou apagões na Suécia e África do Sul, mas não tão intensa quanto a de março de 1989 (Dst = -589 nT), que provocou um importante apagão de 9 horas no Canadá! Uma vez que o máximo do ciclo solar 25 ainda está para chegar, talvez outras mais intensas se avizinhem…? Estejamos atentos aos magnetómetros, e espreitemos o céu das próximas noites!
Na imagem do Sol na banda K1v do Cálcio obtido pelo espectroheliógrafo de Meudon (Observatório de Paris). Nesta figura é sinalizada a região ativa AR3664 que esteve na origem dos fenómenos aqui relatados.
Figura 2: Dados preliminares da componente horizontal (H) do campo magnético terrestre registada na estação magnética do Observatório Geofísico e Astronómico da Universidade de Coimbra. Nesta figura pode apreciar-se o rápido aumento da intensidade de campo magnético resultante do “embate” inicial da ejeção de matéria coronal com o nosso campo magnético (por volta das 18 horas) e o subsequente enfraquecimento do campo magnético durante a fase principal da tempestade. É ainda possível comparar estas oscilações com aquelas que têm lugar em dias geomagneticamente calmos como é o caso do dia 9 de maio.
Fernando Pinheiro – CITEUC, Departamento de Física, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal
Alexandra Pais – CITEUC, Departamento de Física, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal