Sexta-feira 24 de Novembro de 9020

Violência no Desporto em debate na Assembleia da República (2)

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Situando-nos ainda na intervenção de José Manuel Constantino – dentro do tema “A violência no desporto vista pelas organizações do fenómeno desportivo”, o presidente do COP, depois de questionar sobre “o que mudou na violência?”, salientou que “a legalização dos grupos organizados de adeptos foi a resposta que se procurou encontrar ao que crescentemente eram grupos organizados de comportamentos violentos, de má educação e de pequena criminalidade, aqui e ali com um pendor político ligado a organizações extremistas.

E embora essa legalização se tenha tornado um verdadeiro desafio à autoridade do Estado – quer para os que simularam a legalização, quer para os que pura e simplesmente a ignoraram – ela trouxe mais problemas do que aqueles que resolveu.

Diria mais: não resolveu problema algum e criou uma clara promiscuidade entre a autoridade do Estado e grupos organizados de gente cuja afinidade é uma cultura de incivilidade, a que está também associada ao aparecimento de fenómenos de tipo social ligados a grupos portadores de ideologias racistas e fascistas, os quais procuram infiltrar as claques e espalhar a violência gratuita.”

Mais acutilante: “Mas o que já era um problema grave no plano da segurança acentuou-se com a clara ligação/infiltração destes movimentos por grupos de crime organizado, seja no domínio da segurança privada clandestina, no tráfico de droga, corrupção, associação criminosa ou da manipulação de resultados”, pelo que “olhar para as claques como grupos organizados de adeptos ligados pela filiação e paixão clubística é não perceber que o que está para além disso é suficientemente perigoso para a segurança no desporto e na sociedade. E interroga-nos a todos sobre se levamos em devida conta o perigo social que representam.”

Interrogou-se, de novo, quando referiu que “como é que tantos de nós, durante tanto tempo, temos aceitado este estado de coisas?

Como é que pessoas com responsabilidades públicas e cívicas convivem com esta situação?

Como é que suspendemos o nosso sentido crítico e a nossa vigilância cívica não denunciando e não combatendo práticas que atentam contra o valor formativo do desporto?”.

Na mesma senda, o presidente do COP elevou o discurso ao referir que “quando os protagonistas do desporto usam uma linguagem que se aproxima mais do mundo desqualificado e sem respeito pelos outros é de temer o pior. Sobretudo quando esses comportamentos vêm de pessoas que, pelas suas responsabilidades e pela recepção pública que têm os seus comportamentos, não podem dar sinais de relaxamento a uma conduta socialmente responsável”, adiantando ainda que “quando os protagonistas do desporto recorrem ao apoio destes “grupos organizados de adeptos” para legitimarem a sua autoridade ou intimidarem de algum modo a autoridade policial e judicial, ou os órgãos de comunicação social, estamos perante um retrocesso civilizacional à época da guarda pretoriana da Roma Antiga”.

Passou em revista outras áreas como “o problema não está na falta ou imperfeição da lei, estará na forma de a cumprir e executar sem prejuízo de se reconhecer algumas omissões de intervenção do legislador em situações que se percebe que a auto-regula(menta)ção já não se revela suficiente para resolver”, adiantando que “acrescem ainda algumas circunstâncias complementares que a nosso ver explicam a inoperabilidade deste quadro sancionatório no plano da prevenção geral da violência no desporto, como sejam:

- A ideia, perigosíssima, mas que tem feito escola até nos tribunais, segundo a qual o ambiente nos recintos desportivos é caracterizado pelo elevado nível emocional, e é por isso factor de exculpação de comportamentos socialmente condenáveis e por isso intolerados. O que significa que aquilo que não é consentido ao cidadão dizer, fazer ou omitir cá fora, é-lhe permitido dentro de um recinto desportivo.

- A tolerância com que é tacitamente admitida a actividade de grupos organizados de adeptos fora do registo e do enquadramento legal aplicável, responsável por um sentimento de que há regulamentações que não são para levar a sério”, pelo que “ o papel e a responsabilidade do Estado são ineludíveis.”

No quadro da “A Justiça e a Violência no Desporto”, Ruben Oliveira Juvandes, Juiz do Conselho Superior da Magistratura, salientou que “da experiência dos processos que apreciou, verificou-se que parte deles não cabiam na Lei 39/2009 (que trata da violência no desporto)”, pelo que não tiveram andamento, o que, porventura, teve com base uma instrução do processo não condizente com a realidade dos factos, o que colocou algumas questões de apreciação que originaram o não seguimento.

Quiçá derivado das lacunas ou imprecisões da referida lei.

Para David Aguilar, Procurador-Adjunto do Conselho Superior do Ministério Público, a situação não é muito diferente da de Ruben Juvandes e questionou, a propósito, “qual é o papel do Ministério público em função da Lei”.

E interrogou-se, de novo, sobre se é permitido que se façam buscas aos GOA (Grupo Organizados de Adeptos”?

Rematou que fazer prevenção é um “remédio” aconselhável e desejável mas, se não for eficaz, a Lei tem que o ser.

No terceiro e último painel (Violência no Desporto: que papel para a Comunicação Social”), Hugo Gilberto (RTP) justificou que o papel da tv pública é diferente e, por isso, a grelha que apresenta está vocacionada para a prevenção, ética e fair play, enquanto Ricardo Costa (SIC) salientou que “não estou nada optimista que os próximos tempos tragam algo de novo a não ser que se mude o actual paradigma que desprestigia tudo e todos, como se pode verificar pelo número de processos que correm nos tribunais, que condicionam o clima e o ambiente entre adeptos, o que é prejudicial não só para o futebol como a comunicação social, face ao “ordenamento” que alguns clubes promovem neste campo”.

Cláudia Lopes (TVI), considerando que os clubes não disponibilizam imagens dos seus próprios canais, não se pode fazer nada, porquanto nas tv’s a imagem é imprescindível. Abordou ainda a questão de que os jornalistas têm um código de ética a cumprir e que os comentadores nem código sequer possuem, o que faz toda a diferença na organização da programação.

Sofia Branco, presidente do Sindicato dos Jornalistas, recordou que a organização sindical remeteu à Assembleia da República, Polícias e Procuradoria-Geral da República, um documento sobre o que se tem passado, sugerindo que os recintos desportivos tenham espaços em condições – devidamente localizados – para os jornalistas, ao mesmo tempo que salientou que “a crispação existente pode redundar em “bullying”, pelo que é preciso criar condições para um entendimento.

O representante da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, João Pedro Figueiredo, salientou que “a ERC tem poderes limitados mas que actua sempre que é presente alguma queixa, fazendo a arbitragem da situação relatada”, sendo que na maior parte das vezes apenas faz recomendações, porquanto deriva de uma acção reactiva, porque só conhece o assunto depois de concretizado.

Pelo meio ficaram os debates em que intervieram alguns dos agentes desportivos que estavam na plateia da Sala do Senado que, em alguns momentos, teve fases de calor intenso.

Porque é preciso meter mãos à obra, é importante que o governo e a Assembleia da República (em especial esta última Câmara) sejam mais activos e mais céleres a colmatar os “buracos” da lei, porquanto o tempo cada vez é mais corrosivo e o que agora é uma coisa um ano depois já é diferente e poderá ser tarde para a credibilidade para o futebol de um país, que tem sido exemplar na conquistas de títulos internacionais em vários escalões etários e de onde ressalta o de campeão europeu sénior.

 

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