Terminada mais uma edição dos Jogos Olímpicos, com os resultados conhecidos e ainda não debatidos os seus efeitos em termos oficiais – Comité Olímpico de Portugal e, eventualmente, e pelo Governo – aborda-se de novo a temática das eventuais causas psicológicas no menor rendimento de um ou outro praticante e, também, dos comentários vindos a lume por parte da Confederação do Desporto de Portugal (CDP), ao nível dos dois dirigentes mais responsáveis na organização: os presidentes da mesa da Assembleia Geral e da Direcção.
“No alto rendimento há muito cuidado com as lesões físicas mas ignora-se as psicológicas”, escreveu o psicólogo Sidónio Serpa – uma referência internacional de alto gabarito nesta área – em “A Bola”, para se referir à vida desportiva (e não só) do mais medalhado atleta olímpico de sempre, como é o caso do norte-americano Michael Phelps, que conquistou 28 medalhas olímpicas, 23 delas em ouro.
Como relata Sidónio Serpa, Phelps foi “obrigado” a treino bidiário desde os 10 anos de idade, que o levou a passar por várias situações que, em fase extrema, o podiam ter levado à morte.
Abandonou os estudos, foi proibido de praticar outros desportos – quando se recomenda que os jovens façam um pouco de tudo – e o chegar à depressão foi num ápice, onde se incluiu ainda o alcoolismo, o consumo de droga, que o levaram ao internamento para uma recuperação psicológica.
Isto para justificar que, para além da parte física, provavelmente poucos (ainda) são os que se preocupam com a parte psicológica do atleta.
Talvez possamos encontrar aqui parte da resposta para as não conseguidas medalhas por parte de Nelson Évora e de Fernando Pimenta, a que se podem juntar as de Jéssica Augusto e Sara Moreira, embora nestas duas foi (ou terá sido) a parte física a “dar de si” em primeiro lugar. Ou talvez não, se recordarmos que não é o corpo que comanda a mente mas sim a mente a dar ordens ao corpo.
Não se quer dizer que não terá havido acompanhamento psicológico. Mas que faltou qualquer “coisa” disso parece não haver dúvida.
Os factores, endógenos e exógenos, que estão associados à vida de um desportista de alto rendimento são tantos que não é possível criar imunidades para todos. Há sempre uma “brecha” que se abre, em determinado momento, permitindo a “entrada” de “vírus” que, podendo ser considerados como motivadores e, logo, positivos, penetram a mil à hora até no cérebro dos mais fortes, criando debilidades com efeitos diversos.
Falamos da exposição pública, que pode afectar o cérebro, colocar o consciernte em confronto com o subconsciente, de onde dificilmente se sairá com positividade.
Factores deste tipo podem ser, por exemplo, aquilo que os atletas, no seu raciocínio, pensam e dizem sem pensar que isso cria mais ansiedade. “Vão ser os mil metros da minha vida” – referiu Fernando Pimenta ao ser apurado para a final, tendo salientado ainda que “há favoritos (e Pimenta era um) que chegam aqui e bloqueiam e outros atletas conseguem superar-se!”
No final chorou – os homens também choram, ponto final – e encontrou nos factores “externos” um certo escape, complementando que “foi um jogo de roleta em que a bala saiu-me a mim”.
No que se refere a Nélson Évora a frase divulgada ainda foi mais forte do ponto de vista da ansiedade: “ainda tenho mais dinamite para dar!” Se em termos de consciente se pode considerar como uma motivação especial, uma força mental de que é isso que quer, seja de que maneira for, o subconsciente pode não estar na mesma onda “eléctrica”.
Estes baluartes do desporto nacional já comprovaram que são dos melhores do mundo. Mas nem sempre tudo está a favor (deles e de outros). Conquistaram medalhas em Jogos Olímpicos, Campeonatos do Mundo e da Europa.
No Rio de Janeiro, os “ventos” não estiveram com eles, nem mesmo com o Cristo Redentor por perto.
E esta situação poder-se-á, ainda, alargar a mais atletas, quiçá as não conseguidas prestações de Sara Moreira e Jéssica Augusto e as menos boas exibições de outros.
Há muito mais para conquistar. Mas será bom ter presente o que, uma vez mais, referiu Sidónio Serpa: “no alto rendimento há muitos cuidados com as lesões físicas, mas ignora-se as psicológicas”. E também, acrescentamos, consultores de imprensa com experiência de e nas cabinas para poder acompanhar, perceber e ajudar os atletas! Que, a haver, serão muito poucos!
Isto porque tem de haver cuidado no diz-se … diz-se, em especial entre as várias fases das provas, em que os atletas devem ser poupados em comentários que não deveriam ser feitos antes da última fase em que participassem, para não se perder a concentração que se torna indispensável entre eliminatórias.
E mais grave quando se aproveitam as redes sociais para desabafar algo que devia ser feito, primeiramente, em particular e articulado com as respectivas federações e o comité olímpico.
Federações que, no princípio e no fim, decidem e indicam os atletas que deverão ser indicados ao comité olímpico, a quem cabe fazer a respectiva inscrição.
E não ao contrário, isto é, ser o comité olímpico a seleccionar os atletas, porquanto a responsabilidade técnica está assente em cada uma das federações.
Por isso, não se entender as posições públicas (em artigos de opinião pessoal insertos nos jornais Record e A Bola, respectivamente) tomadas quer pelo presidente da Mesa da Assembleia Geral, quer pelo próprio presidente da Direcção da Confederação do Desporto de Portugal – CDP (que até foi presidente da Federação de Atletismo), este último a escrever que foi “vergonhosa” a participação dos maratonistas (masculinos) na prova em apreço.
Terá isto – estas posições públicas – a ver com uma pré-candidatura ao Comité Olímpico? Colocar as Federações contra o Comité ou criar divisões entre as duas estruturas supra-federativas, sendo que as Federações são os associados do COP e da CDP?
De tudo isto, o que pensar? Que o sistema desportivo nacional – em parte – continua “doente”, com os princípios éticos muito por baixo!